quinta-feira, 3 de março de 2016

10 anos depois...

Dez anos os separam. Às vezes parece tanto, às vezes quase nada.

Olho para Mateus e não são poucas as vezes em que me lembro de Lipe em sua idade, e de mim, como sua mãe, dez anos mais nova. Fico divagando, tentando projetar sua vida dez anos para frente. Especulações, meras especulações.
 
No último sábado, meu cunhado, sem saber das minhas divagações, comentava sobre a semelhança de Mateus com Lipe na sua idade, cheio de "por quês".
 
Eu até então não havia me dado conta desta semelhança que, de fato, é notória. É que eles são tão diferentes em outros aspectos.
 
Com 4 anos, Lipe leu sua primeira palavra (Vivo, numa Feira de Livros patrocinada pela operadora), Mateus mal distingue letras de números.
 
Lipe era compenetrado, sério, curioso, focado em seus interesses. Teve sua fase de Bob Esponja, dinossauros, ferramentas, Max Steel e, em cada uma delas, praticamente esquecia que existiam outras formas de entretenimento ao seu dispor. Era um leitor contumaz, desinteressado por tecnologias e sedento por informações.
 
Mateus é despojado, de riso fácil, cativante. Não se interessa por brinquedos específicos, mas pode inventar brincadeiras das mais diversas com bolas plásticas ou bolas de soprar. Gosta dos livros, mas não os busca com fervor. Mas quando lhes são oferecidos, invariavelmente, tenta lhes dar uma outra conotação. Busca a tecnologia, mas como não estimulamos, não se frustra com isso. Tem uma natureza exploradora, aventureira.
 
Lipe era retraído, e, mesmo chateado, não se rebelava, sendo incapaz de levantar a voz a um adulto. Mateus, quando contrariado, não hesita em me chamar de chata.
 
Lipe teve uma mãe que gritava mais, que por algumas vezes lhe respondeu "sim porque sim" e chegou, em raros momentos, a lhe dar umas palmadas. Com Mateus procuro manter o tom de voz sempre estável, lhe dar uma explicação convincente a todos os seus questionamentos e, por ter-me desacreditado da função pedagógica das palmadas, tal ideia sequer passa pela minha cabeça
 
Lipe adorava ir ao mercado com o avô (com quem moramos até ele completar 1 ano e 4 meses), Mateus, com o pai.
 
Mateus é super investido nas artes culinárias. Não me pode ver na cozinha que já vai puxando seu banquinho para me acompanhar. Já sabe fazer bolo, sempre me ajuda a mexer uma panela e, agora, está aprendendo, por vontade própria, a lavar a louça. De verdade! Lipe aprendeu a fritar ovo e fazer beiju e brigadeiro depois de mais crescidinho. Mas sempre deixa a louça suja na pia.
 
Lipe sempre foi muito decidido em suas transições. Mesmo tendo dividido o quarto conosco nos primeiros 16 meses de vida, adaptou-se fácil ao seu quarto, logo que nos mudamos. Nunca chupou chupeta (nem dedo), nem cheirou fraldinha. Não deu trabalho para trocar a mamadeira por copo, nem para dormir sozinho, depois de termos combinado que, com 4 anos, ele estaria pronto para dormir sem a minha companhia. Aqui preciso abrir um parêntese para falar da minha surpresa e da minha disposição para abrir uma exceção no dia seguinte ao seu aniversário de 4 anos. Tínhamos combinado que, com 4 anos, ele dormiria sozinho. Eu o arrumaria, leria uma história e sairia do quarto para que dormisse. Negociamos isso por cerca de 2 meses. Mas no dia seguinte ao seu aniversário (porque no dia propriamente dito ele já chegou da sua festa dormindo em casa) estávamos em São Paulo, na casa do seu avô. Fiz o que tínhamos combinado, mas fiquei do lado de fora da porta, pronta para entrar ao primeiro chamado que ele fizesse (já que estávamos fora de casa). Mas ele dormiu sozinho, como havia se comprometido. E bem!
 
Mateus chupou chupeta, cheirou fralda, deu trabalho para deixar a mamadeira e não dá mostra nenhuma de querer abrir mão da minha companhia para dormir (o que eu, particularmente, adoro rs), mesmo sendo bastante independente para várias outras coisas, como foi em relação ao desfralde. Comecei a tirar sua fralda quando achei que estava pronto, aos dois anos, e, uma semana depois, mesmo usando fralda para dormir, parou de fazer xixi na cama. Com as fezes não tive problema também. Primeiro penico, depois vaso com redutor e, há aproximadamente um ano, em qualquer vaso, de qualquer lugar, ele faz o seu serviço. Já a transição das fezes de Lipe foi meio traumática.
 
Nenhum dos dois nunca gostou muito de heróis, de Lego, de brinquedos típicos de meninos. Mateus se diverte com os brinquedos de Leti, aos quais Lipe não teve acesso em sua idade, porque não tinha uma irmã.
 
Os dois já calçaram os meus saltos.
 
Lipe foi filho único por 6 anos, Mateus já chegou dividindo o espaço com dois irmãos. Lipe teve dois grandes amigos de escola com 4 anos. Mateus também.
 
Lipe viveu toda a primeira infância tendo um pai de fim de semana. Com 3anos, Mateus teve a sorte de comemorar o retorno do pai ao nosso convívio diário.
 
Mateus se deixa levar por sua criatividade, inventando histórias que teimam em me surpreender. Lipe sempre foi pé no chão.
 
Mateus diz que quando crescer vai ganhar dinheiro e comprar cerveja (oi?), Lipe dizia que seria consertador. E hoje fala em ser médico.
 
Lipe começou a tomar refrigerante com 12 anos, Mateus acha que se trata de uma bebida tenebrosa que só adultos podem experimentar. Lipe, apesar de não gostar de muitas frutas nem verduras, não me dava trabalho para comer. Mateus não come verduras, ama todas as frutas, mas faz com que eu me sinta em uma verdadeira loteria todos os dias na hora do almoço, sem saber como será a sua performance.
 
Lipe ouvia Xuxa, Mateus ouve Palavra Cantada e Canela Fina, dentre outros. Os dois tiveram oportunidades semelhantes de contato com cinema, teatro, museus, parques, praças e afins.
 
Lipe é escuro. Mateus, claro. Lipe é grande. Mateus, mignon. Lipe tem dentes fortes e saudáveis, os de Mateus são frágeis. Os dois têm um lindo sorriso!
 
Apesar de não termos certeza nenhuma em relação ao futuro dos nossos filhos, Lipe já dá mostras de que se prepara para ser um grande homem. Lindo por fora (e não sou só eu quem diz isso) e mais bonito ainda por dentro. Seu processo de amadurecimento está permitindo que deixe aflorar o seu lado família, a sua responsabilidade, o seu senso de humor, a amplitude da sua compreensão de mundo, a sua capacidade de pensar a longo prazo...
 
É um processo complexamente mágico que me encanta e faz com que eu me apaixone, ainda mais, por meu primogênito que, a cada dia, se torna meu grande companheiro.

E aquela mãe insegura de 10 anos atrás começa a colher os frutos da semeadura do amor, cultivando, agora, uma sensação diferente.

Sim, porque perceber a gritante diferença de meus filhos, com qualidades tão marcantes, e suas específicas peculiaridades, ao mesmo tempo em que enxergo, em mim, o que a maturidade me agregou, me enche de uma pulsante expectativa, envolta de uma confortante tranquilidade, em relação ao que virá.

Porque, no meu íntimo, sei que o sorriso contagiante e apaixonante do meu pequeno não se perderá no caminho (e estarei diligente para fazer a minha parte pela preservação deste seu maior patrimônio), e que, daqui a dez anos estarei renovando a sensação de viver, sabe-se-lá de que maneira, a grande felicidade de compartilhar o seu processo de amadurecimento.




 
 

2 comentários:

ANTONIO CARLOS disse...

Jana, acho muito dificil nao ser seu fa e, tambem, te parabenizar por seus escritos tao lucidos, sensiveis
e de uma leveza tao boa que nao nos deixa parar de ler. Parabens querida!!

Roberval Mascarenhas disse...

Jana, simplesmente fantástico.
Parabéns do seu eterno fã.
bjs

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